Do Dicionário de Citações

Dupla delícia.
O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.
Mário Quintana

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Sobre Livros - Os Inimigos dos Livros


O caso de um bibliômano

Na ficção de Flaubert, o caso por ele narrado de um bibliômano
teria sido publicado na Gazette des Tribunaux 
Água, fogo, inveja... há muito esta coluna tem se ocupado da temática do amor aos livros. Seria possível, todavia, enumerar seus principais inimigos?
Não falemos da água. Afinal, quando bem empregada, ela constitui uma etapa importante para a recuperação de livros esquecidos pelo tempo, cujos papeis foram carcomidos pelas traças, pela humanidade, quando a própria crítica roedora dos ratos não se ocupou de seu destino.Esqueçamos por um momento o fogo, este algoz das grandes bibliotecas perdidas no passado. Deixemos igualmente de lado as fogueiras que por séculos arderam contra homens e livros. É certo que as fogueiras de livros, como aquela promovida pela Alemanha sob o nazismo, devem se fixar para sempre na memória da humanidade. Mas, por alguns segundos, pensemos apenas nos inimigos menos evidentes.

A inveja foi o motor de um caso de bibliomania levado às últimas consequências. É Flaubert quem nos conta esta história. Tudo se precipita na vida de frei Vicente, este colecionador intimorato de raridades, no momento em que vê para sempre perdido em um leilão a razão maior de sua cobiça, a edição de Furs e ordinacions fetes per los Gloriosos reys de Aragò als regnicls del regne de Valentia. Era em verdade o exemplar único de um livro impresso por Lambert Palmart, o pioneiro da tipografia em Barcelona, em 1482. Único conhecido, o qual fora parar nas mãos de um desafortunado comerciante. Pois fortuna, embora ele a tivesse, não lhe bastou para salvar a biblioteca, que ardeu em chamas, o livro recém-adquirido e a vida. Tudo lhe tirou nosso frei bibliômano, ardendo, ele mesmo, de inveja. Não era a primeira vez que cometera crime de tal natureza. Sempre que a sorte lhe faltava e uma raridade cobiçada caía nas graças de algum comprador de posses, frei Vicente tratava de o recuperar às suas custas. Os autos processuais que o sentenciaram à pena do garrote arrolaram uma lista razoável de crimes confessos pelo próprio réu.
Difícil separar a ficção da realidade. Tanto quanto definir as fronteiras entre o amor e a paixão, ou mesmo entre o amor e o desejo de posse, o qual pode se tornar um caso patológico, ou um objeto da psicanálise. Ou de polícia. Cumpre notar que nos tempos de Flaubert a bibliomania era vista com reserva, particularmente nos círculos intelectualizados. Era algo mais do que colecionismo, esta mania aristocrática herdada pela burguesia na era industrial. Tampouco se tratava de simples exibicionismo, este, sim, um comportamento burguês. Um bibliômano sabia guardar em segredo sua presa. Quantas raridades teriam sido descobertas na casa daquele pobre frei tomado pela inveja e pela cobiça dos livros? E quantas outras obras não teriam sido consumidas pelo fogo? Pois um bibliômano não ama. Ele envenena e desdenha tudo ao seu redor. Até mesmo os livros. Eis a sua armadilha.
Artigo publicado na Revista Brasileiros, junho de 2013.

domingo, 9 de junho de 2013

Novidade - Revista do IEB no ar

A Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (USP) agora pode ser lida na internet.
E sai com a chancela científica do Scielo. Evoé novos leitores!